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domingo, junho 18, 2006

Cotidiano de um suburbano - o final

Vago sem rumo pela Ghotam paulista. Desconheço o meu caminhar , meio capenga nessa urbe esburacada. O sereno da noite umedece minha cútis. Sinto a friagem gelar meus ossos, preciso de algo quente para beber, um uísque, uma tequila... uma pinga! Qualquer destilado que possa aquecer minhas entranhas sedentas, secas.
Apenas uma dose...

Meu peito dói muito! Trêmulas minhas mãos parecem não me obedecerem , à tempos perdi o controle sobre elas.
O relógio na torre do Mosteiro parece não funcionar. Chego à imaginar os áureos tempos da minha juventude. Tempo...esse sujeito foi implacável comigo, meu reflexo, já arqueado da minha imagem, sombreada na vitrine da loja não mente.
A rua continua deserta, erma. O arrulhar dos pombos quebram este silêncio mórbido. A penumbra noturna é recortada de forma geométrica pelos feixes que se formam das luzes de mercúrio que pouco iluminam. Cadê a tecnologia dos grandes centros urbanos?

Continuo minha busca, meu caminhar, meu rumo.
Três vultos tomam forma ao longe, é impossível descrevê-los, usam capotes negros e longos que cobrem-lhes os rostos mal encarados, pálidos ...barbas por fazer, carecas. São skinheads! Anarquistas! O que fazem ali?
Suburbanos como eu? Ou ...estereótipos de uma sociedade desestruturada pelo capitalismo espoliativo, que vagam como animais sedentos, madrugada adentro, em busca de uma presa, um troféu? Serei eu a presa? Não! Absolutamente! Não!
Continuo convicto e retilíneo em meu trajeto. Como se fosse dono daquele espaço da urbe. Desistir naquele instante, traria à tona todos os meus piores medos... Meus paradigmas? Se foram, estão quebrados e estilhaçados!
Porquê temer? Estou convencido dos meus medos. Resistirei! Não pertenço à cadeia alimentar dessa casta preconceituosa e racista... Encaro-lhes...
Cochicham e balbuciam palavras entre eles, signos de um dialeto indecifrável, insignificantes para mim...
Bato de ombros num deles. Paro ainda de costas, indeciso e amedrontado. Fui corajoso, mas até que ponto?

Será que ... que besteira cometi?Devo continuar...reagir. Minha mente doentia não permitiria não tenho forças ... nem tempo! Se foram...
Violência ?O mundo já anda tão violento! Certamente seria esmagado, massacrado, desovado, uma página efêmera dos tablóides vespertinos.
Quero apenas um drinque! Nada mais do que isso!
Sou espelho dessa sociedade que violenta meu corpo, já cansado, todos os dias. Nenhuma assistência.
- COF! COF ! COF!
Por alguns minutos uma tosse purulenta me acomete violentamente. No peito a mesma dor, pungente, que parecia sair do fundo da alma.
Estou cansado, atordoado... recostei-me junto ao poste, me serviu de bengala. Vieram as náuseas, ô vômito incontido em forma de borra de café. Quero recobrar os sentidos, preciso de um trago...Argh!
Não sinto minhas mãos trêmulas como antes, estou sonolento! Minha garganta está insípida...Essa dor... continua latente.
Uma paisagem fica estampada em minha memória. O que está acontecendo afinal? Parece que flutuo, pairo sobre àquele corpo iluminado pelo feixe de luz mercúrio... um quadro pintado à óleo, cena de natureza morta. Elo morfético...hipotético... da urbe urbanizada.


Luiz Carlos Reis

segunda-feira, junho 12, 2006

Cotidiano de um suburbano - O começo

O dia promete ser atribulado. O vai e vem de pessoas esbarrando-se entre si, cada qual no seu rumo, incerto, efêmero, às vezes sem sentido, me atordoa.Sou mais uma incógnita, anônima. Receoso indago que caminho devo seguir ? Essa pós- modernidade utópica e retrógrada me contagia ... Sou fruto passivo da xenofobia congênita, que impregna as “coisas velhas” e ultrapassadas... vencidas. Um novo plano eclode da virtualidade: o subjetivo humano.
Penso, talvez eu exista! Descarto qualquer plágio!
As unanimidades persistem e corroem as discussões sem argumentações.Existem dialéticas sem fundamentações ou filosofias artificiais?
Nas ruas tribos amotinadas amontoam-se e disputam espaços urbanos nos picos mais altos da selva de pedra. Pitorescas são as formas e os variados signos que maculam a arte... rupestres. Retroagimos?
Como animais racionais nos isolamos do mundo a nossa volta. A tela do computador, a televisão, a internet, hipermídia... essa “coisa” chamada modernidade tecnológica tornou-se nosso mundo visionário. Indefesos e acuados não sabemos como fugir. Neste exato momento nos tornamos escravos e não vemos mais pessoas indo e vindo, o gerúndio se torna implacável. No recôncavo do nosso leito pagamos pela virtualidade subjetiva e... manipulamos nosso cognitivo, formatamos nossas vidas. Os esboços ao nosso redor, são retratos pitorescos, cubistas, reproduzidos em cadeias e elos que tentamos cruzar com a realidade. Volto à utopia antagônica que me impregna. Estamos apáticos à realidade que nos cerca.Voltemos à realidade. Quanta tecnologia! Mas que importa, sou avesso a ela, xenófobo, absolutamente...xenófobo. Quero afogar o celular... na privada!Internet?
Universo midiático sem sentido e virtual. Quanta viagem! O contexto é outro, corro para não perder o ônibus, a estas horas lotado na imensa Gothan City paulistana.
No coletivo, entupido, odores ardidos e fétidos dos amplexos involuntariamente arvorados, que nos abraçam a balaústres capengas e recostos rudes. No balanço da Nau urbana e sem velas ...o vento dissipa a catinga.

Luiz Carlos Reis