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segunda-feira, outubro 02, 2006

Conto sertanejo

Mais um conto da fábula brasileira, talvez uma mostra singela do quadro conjuntural e social do país que sobrevive voraz às mazelas fundadas sob a égide do capitalismo espoliativo. De ações nada significativas, porém, extremamente imperialistas, que impõe aos países emergentes e de primeiro mundo, um produto atrasado e retrógrado: o subdesenvolvimento. Obviamente não ousaria falar de comunismo ou socialismo numa época em que conflitos entre direita e esquerda, permanecem escusos em castas pragmáticas, doutrinadas por partidos de extrema. Mutáveis, céticos vestidos com a indumentária da moralidade demagoga e utópica.
Retórica crônica ... Sim! Começa pelo indivíduo, doravante designado cidadão ou qualquer que seja a alcunha, que desde o nascimento merece um nome, uma certidão natural, direito jurídico legal e constituído, entre tantos outros que "não" lhe são assegurados mas subtraídos, apresento-lhes José, ainda sem nome, claro, porém, corroborando para o crescente quadro natalício brasileiro, estimado em 180 milhões de cidadãos.
Redundante suponho, mas compõe fielmente as estatísticas dessa miscigenada nação tupiniquim.
Na cabeça dos pais do pequeno menino a aflição. Mais um nordestino, mais um sertanejo sofredor, vivendo às duras penas na caatinga. Sem brasão ou ascendentes ricos, mas estabelecidos e familiarizados com a miséria e os piores índices de desenvolvimento humano. Excluídos! Pobres ou miseráveis? Para os progenitores do pequeno menino, não importavam as estatísticas, queriam o melhor para seu rebento.
Relembro a velha utopia da migração nordestina: aquela de tentar a vida na cidade grande.
O pirralho nasceu de parto parido, melhor com parteira. A dita cuja tinha muita experiência, um currículo invejável à muito obstetra da capital, quantas raparigas haviam passado por aquelas mãos de unhas micosadas e calejadas pelo cabo da enxada. No rosto a expressão carcomida, enrugada, sofrida pelo tempo que o sertão impõe de sol-à-sol. Estereótipo clássico do sertanejo sofrido. O menino, nasceu miúdo, muito minguado e raquítico, dava dó, era pele e osso, parecia que nem respirava. A mãe olhava aturdida ...Falaciosa. Sequer tinha leite para amamentar o moleque. Misturavam água do açude, meio barrenta, ao pouco leite que ordenhavam de uma velha cabrita... Para completar a ração. O pasto seco do chão de terra batida e esturricada, a palma que impregnava a vegetação mórbida do local, não venciam a fome do pobre caprino. Foram dias difíceis para a família de José! Não demorou muito e a coitada virou comida. No sítio, de nome "enjeitado", não havia luz elétrica, nem água encanada, contentavam-se com a água barrenta do açude. Uma realidade nacional em pleno século 21. Mas o sertanejo é forte e fervoroso não se importa com a tecnologia. Sua vida é trabalhar para comer, sair da míngua, sonhar com a vida na cidade grande, dar condições à sua descendência e casta. Quer um trabalho que o dignifique... Triste ilusão!
Mas a coragem não lhes faltam. A luta é constante.

Do árido sertão ficaram as lembranças e a saudade. Da casa de pau à pique e da pequena horta... Esturricada, não levaram nada.
O sonho da cidade grande era maior e romperia qualquer fronteira. Deixaram o "sítio enjeitado" e embarcaram no último pau-de-arara. À frente... O sonho e uma realidade sucumbida pelo descaso.


Luiz Carlos Reis

20 comentários:

Kafé Roceiro disse...

Infelizmente essa é a estória de muitos brasileirinhos que vão pra cidade grande crendo que vão ter uma vida melhor. Depois, lá na favela e desempregados choram de saudades do sertão e não tem dinheiro pra voltar. Muito triste! Mas real! Valeu mesmo...

Susana Miguel disse...

Obrigada pela visita e pelas palavras:)
Seja sempre bem vindo!

Um abraço.

Poemas e Cotidiano disse...

Luiz Carlos querido: Bom dia!
Que historia linda e real. Linda nas palavras, nas descricoes.
Triste na realidade. Algo que sabemos existir e nao estar apenas na narracao dos Contos.
Um beijo carinhoso meu amigo! Adoro seu Blog!
MARY

PS: E essa musica ainda continua tocando em meus sentidos quando saio daqui...

Anônimo disse...

Assim a correr para deixar um grande abraço!

Jéssica disse...

Qtos que vêm pra cá à procura de algo melhor pra si... e se dão mal. Muito bom seu texto, bem atual. Adoro essa música. Beijo*.*

Um Poema disse...

O drama dos pobres magistralmente humanizado nestas tuas linhas. A consciência de quem não abdica da denúncia, ao ser voz dos que não têm voz, neste retrato.
Excelente trabalho. Parabens!
Um abraço

Pete disse...

Uma triste realidade, vivida não só aí mas em muitos lugares do mundo.

Um Abraço e bom fim-de-semana.

Kaotica disse...

Esse teu texto é simultaneamente muito bem escrito e bem realista, no sentido em que a história retrata uma realidade que é do Brasil mas que também é universal - a pobreza na sua constante luta pela sobrevivência. Independentemente de se o realismo é actual ou se está ultrapassado, que são discussões de uma certa moda estética que também passa (infelizmente!) pela Literatura e pelas Artes, que deviam ser totalmente livres de espartilhos impostos por pseudo-modas - o teu texto irrompe como um exemplo de que a tua escrita deve seguir a tua intuição de seguir atrás de o que é realmente importante. A questão da pobreza e dos desfavorecidos que não têm qualquer suporte, conta com pessoas que saibam olhar o outro, capazes de se transfigurarem nele e de se darem conta do drama humano que cada uma dessas vidas representa. Costumo dizer que o fim do mundo é todos os dias porque não conto só comigo e sei que para muitos infelizes assim é. Mas cada vez há mais pessoas cujo umbigo tudo preenche impedindo-os de ver para lá dele. Não é o teu caso, meu amigo. Adorei o texto, pela sua escrita e pela sua urgência!

Jéssica disse...

Lindo final de semana, beijo*.*

Light disse...

Meu amigo,como me perco nas tuas palavras e almejo cada texto teu...mais uma vez adorei.

Luna disse...

Uma realidade não com quem procura melhor vida nas cidades, como tambem nos emigrantes, vidas dificeis
beijos

Lata Mágica Recife disse...

Puramente real, nos do Lata Mágica conhecemos vários amigos que saíram do sertão e estão aqui no grande Recife em situação bastante difícil. Más o sonho de melhorar de vida esta constantemente no olhar de cada um.
Abraços dos amigos da Lata Mágica Recife:
Willam & Odilene

tb disse...

A tua escrita sempre tão bem cuidada e tratando de um olhar sobre a realidade do mundo que nos rodeia. Sim porque o que aqui descreves é a realidade de uam parte tão grande da humanidade. As quimeras atrás das quais os homens correm para colherem uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma...
Beijinhos

Jéssica disse...

Passando pra te desejar uma terça-feira linda, beijo*.*

Poemas e Cotidiano disse...

Oi Meu querido Amigo!
Passei aqui para lhe desejar um bom dia, e logico, ouvir Georgia!
Que voce tenha um lindo dia!
Beijos
MARY

ruth ministro disse...

Pobreza... tristeza... cruel realidade... mas o sonho e a vontade nunca morrem... Beijos

Anônimo disse...

Quando te leio meu vocabulário enrriquece e principalmente, paro do nada para refletir.

Beijos!

Poemas e Cotidiano disse...

Oi meu amigo querido:
Passei aqui para lhe desejar um lindo domingo, ver se voce postou, e LOGICO, ouvir minha musica preferida.
Um beijo com carinho
MARY

Alexandra disse...

Olá Luis carlos quero convidalo a visitar meu blog de textos e imagem e se posso link você lá. um grade abraço.

Kafé Roceiro disse...

abraço procê, amigão!